quinta-feira, 22 de setembro de 2011

E o rio de amanhã?



As várias poluições que atingem o rio Sergipe põem em risco a economia, a cultura e a vida que ele representa.

Por: Egicyane Lisboa, Emily Lima, Lenaldo Severiano, Liliane Nascimento e Pedro de Santana

Bueiro jogando esgoto no rio Poxim, próximo à UFS
Inúmeras latas, garrafas, pneus, sacolas plásticas, isopor, uma pia e um armário. Esses objetos e muitos outros foram vistos em poucas horas nas margens do rio Sergipe, o mesmo rio que banha 26 municípios do estado e beneficia cerca de 1 milhão de sergipanos.  A importância dessa bacia hidrográfica fez com que fosse criado em 2004 o dia do rio Sergipe, definido como 3 de novembro, uma iniciativa interessante, mas que não tem sido suficiente contra todos os outros dias de poluição.
Muito da história, da cultura e da economia dos sergipanos deságuam no Rio Sergipe e nos seus afluentes, neles também tem desaguado a falta de cuidados em forma de esgoto e lixo, jogados diariamente e que interferem não só na preservação do espaço natural, mas também em atividades relacionadas ao rio como a pesca, o lazer e a exploração do seu potencial turístico. A poluição do rio Sergipe nem mesmo é feita em segredo, é fácil observar volumosas quantidades de lixo, pneus e esgotos em um rápido passeio pela margem que banha Aracaju.
Peixe e esgoto em um habitat comum
O descaso com o rio Sergipe já foi atestado em pesquisas, mas mesmo antes disso, foi sentido pelos sergipanos que trabalham em contato com ele, como o pescador Edmilson Higino da Costa que, assegurado pela experiência de mais de vinte anos, afirma que a poluição está cada vez pior, o que interfere na qualidade e quantidade dos peixes e tem tornado a vida do pescador cada dia mais difícil. “Esse rio é muito poluído. Eu encontro muita bolsa plástica, pneu, garrafa pet, até sofá, mesa e cadeira eu já encontrei. Falta consciência do governo e do povo.
Pescador e pneus
Outro lado da poluição é sentido pela família da Dona Cecília Pinheiro Santana que mora às margens do rio Poxim, afluente do Sergipe, com outras 11 pessoas em uma pequena casa, próxima à Universidade Federal de Sergipe (UFS). Esta família vive da catação e reciclagem do lixo que, segundo Dona Cecília, é trazido pelo rio ou coletado em uma pequena canoa da família ao longo das margens em direção à Aracaju. A consciência da poluição faz com que as crianças da casa sejam proibidas de brincar no rio e que a água bebida venha da universidade, pois eles não possuem água encanada, esgoto apropriado ou coleta de lixo doméstico. A água para tomar banho e lavar roupas e utensílios é trazida por um conjunto de mangueiras de outra parte do rio, julgada menos poluída.
Como é comum a cursos fluviais que atravessam centros urbanos, o rio Sergipe tornou-se tão importante quanto ameaçado. Situação semelhante atinge o rio Tietê, em São Paulo, o rio Capibaribe, em Recife e até o rio Citarum, na Indonésia, além desses podem ser citados outros tantos rios urbanos, não como exemplo, mas como avisos e sintomas a combater. Segundo a tecnóloga em saneamento ambiental, bióloga e mestranda em desenvolvimento e meio ambiente pela UFS, Débora Moreira de Oliveira, os problemas gerados pela poluição têm consequências incontáveis e imprevisíveis. “A grande preocupação atual é com a perda de biodiversidade associada à intervenção humana nos mais diversos ambientes.” Ela relaciona esta perda de biodiversidade a distúrbios em cadeias alimentares que podem afetar o homem: “seja pela não mais existência de um organismo essencial para a cura de uma doença ou pela proliferação de pragas que não têm mais o seu predador correspondente.”
Terminal pesqueiro de Aracaju
Entre os perigos diretos para o homem a bióloga indica que dependendo do tipo de uso, os riscos são modificados e intensificados. “No uso de um corpo hídrico contaminado em balneários (praias e rios) os riscos ao ser humano podem ser desde uma ordem mais superficial, como a ocorrência de pequenas lesões na pele, a sérias doenças como a cólera, febres tifóide e paratifóide, esquistossomose, dentre outras. A contaminação também pode vir através da ingestão de água contaminada, de forma rápida, a exemplo da contaminação por vermes, ou de forma lenta, como quando ocorre contaminação por metais pesados presentes na água consumida ou nos animais contaminados (peixes, crustáceos)”.
Mesmo responsável por parte da poluição, na população também surgem iniciativas louváveis como o projeto Construindo uma Jabotiana Saudável que mobiliza a comunidade através de reuniões e caminhadas anuais, organizadas pela equipe de saúde da UFS Manoel Souza Pereira em parceria com escolas do bairro, conselho local de saúde e organizações locais. A Escola Estadual Profº Manuel Franco Freire está entre as instituições de ensino e sua diretora, Maria Suely Silvestre Monteiro, afirma que a escola é um local apropriado para as iniciativas ambientais, pois atua educando não apenas alunos, mas a comunidade para o cuidado com a natureza. “Os moradores vigiam o rio que passa na Jabotiana e estão atentos quando as construtoras e fábricas jogam dejetos no mesmo”.

Pelas ruas de Aracaju, a arte também vem protestando contra a poluição do rio Sergipe, em uma pintura que parece sair da parede, o grafiteiro André Chagas mostra um homem que grita uma lição importante: “Óoii tome conta desse rio!!!”. Ensinamento que já chegou à pequena Ana Raquel Oliveira Farias, de 11 anos, aluna da escola citada acima. “Jogando lixo no rio não tem como a gente viver em paz”. As crianças do projeto aprendem a preservar os rios para construir um futuro melhor e são orientadas a transmitir o conhecimento a amigos e familiares.
Esgoto seguindo para o rio, no centro de Aracaju
Foi dito e repetido por ambientalistas, biólogos, uma série de especialistas e até pelo senso comum, o rio é importante, mas se o discurso não se transformar em ação e as garrafas, sacolas, latas, pneus, pias, armários e esgotos não forem retirados e deixarem de ser jogados, o rio estará fadado a um destino semelhante ao de outros rios urbanos, que têm se transformados em esgotos a céu aberto. Sem um trabalho efetivo os grafites serão só manchas na parede e as vozes das crianças irão para o nada assim como os peixes, os mangues, a diversão nas águas e a beleza para encantar os olhos dos moradores locais e dos turistas.


2 comentários:

  1. Ótimos texto e imagens. Parabéns, galera.

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  2. Bem, então o rio Capibaribe e Beberibe
    não são os únicos que sofrem esse descaso
    no nordeste, sou pernambucano e posso confirmar a verdadeira falta de noção ,relatada em sua reportagem, com nossos rios e como vocês também temos
    campanhas educacionais a mais conhecida é ''Eu quero nadar no Capibaribe'' que apesar de muito interessante não consegue atingir uma quantidade relativamente grande de pessoas e se torna quase que isolada.
    Parabéns pela matéria textos inteligentes e fotos muito boas.

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