quinta-feira, 22 de setembro de 2011

A FILA ANDA?

Filas compõem a paisagem no cotidiano urbano de Aracaju
Por Iargo Souza, Nayara Arêdes,
Paulo Lopes, Raimundo Morais e Victor Limeira

No caminho do trabalho, no supermercado, no banco, no consultório médico. Em pé, sentado ou ainda de outras formas. As filas são uma constante na vida de todo cidadão, independente da função que ocupe, de onde more, de como se locomova e de quais locais freqüenta. É difícil pensar em um dia em que não pegamos fila: podemos perder apenas alguns minutos em uma pequena fila do caixa eletrônico, ou horas na fila de uma repartição pública para retirar um documento, por exemplo – como acontece diariamente no Centro de Atendimento ao Cidadão (Ceac), uma das filas mais famosas de Aracaju. Esta fotorreportagem ilustra algumas das muitas filas que se podem encontrar em diferentes pontos da cidade, em apenas uma manhã.

Às seis da manhã, no Terminal Rodoviário José Rollemberg Leite, o número de pessoas à espera da senha já chama a atenção. São duas filas: uma preferencial – para idosos acima de 60 anos, gestantes, portadores de deficiência e pessoas com crianças até 2 anos – e uma comum. Um dos primeiros da fila, Aldo Santos, 43 anos, tenta pela segunda vez recadastrar seu título de eleitor. “Da outra vez cheguei mais tarde, mas hoje cheguei às 5 da manhã para tentar resolver”, diz. No outro extremo da fila, dona Maria José, 58 anos, diz estar espantada pela quantidade de pessoas: “Trabalho aqui perto, e passei para tentar marcar uma consulta médica. É sempre cheio, mas hoje está demais. Vou ter que voltar outro dia”.
Quem trabalha no Terminal Rodoviário já está acostumado com o tamanho da fila do Ceac. É o caso da atendente de uma das lanchonetes, Mônica Azevedo, de 28 anos. “Hoje está até pequena. É sempre assim, ou até pior. Já vi gente ficando nervosa e voltando pra casa sem conseguir atendimento”, conta. Esperando pelo atendimento na fila preferencial, Lealdo Almeida, 63 anos, diz já ter passado por preconceito pelo fato de exercer seu direito ao atendimento prioritário: “Uma vez, quando estava no mercadinho, passei na frente na fila do caixa. Uma moça ficou me olhando de cara feia e soltando piadinhas. Mas esse é meu direito enquanto idoso”.
Compondo o cenário do terminal, uma extensa fila de táxis espera logo ali em frente pela próxima corrida. Os taxistas tem a fila como parte de seu trabalho, como é o caso do senhor Damião, 55 anos, que trabalha nesta profissão há 25. “Durante o dia, cada um aqui pega quatro ou cinco corridas. A gente demora em média duas horas pra pegar uma corrida, e depois volta ao final da fila.”
No centro da cidade, as filas são uma realidade nas agências bancárias. Antes das 10 horas, horário em que os bancos abrem, as pessoas se aglomeram na área dos caixas eletrônicos enquanto esperam o horário de atendimento. Numa das agências, o escriturário Gilmário Souza, 24 anos, fala a respeito do número de pessoas que por ali passam todos os dias: “não tem como dizer o número exato, mas são sempre muitas pessoas”. E a fila não termina mesmo depois que o banco entra em funcionamento. Depois de entrar, as pessoas permanecem esperando até que suas senhas sejam chamadas nos caixas. E é aí que entra em cena a Lei Municipal de número 2636/98, mais conhecida como “Lei dos 15 Minutos”. A lei – que garante aos clientes o direito de serem atendidos em no máximo 15 minutos em dias comuns, sendo prevista multa à agência que descumprir a norma – está em vigor em Aracaju desde 2007. O escriturário confirma que a agência em que trabalha tenta cumprir a regra, mas que eventualmente podem acontecer atrasos.
As filas não param por aí. Ainda no centro de Aracaju, uma das filas mais populares é a do Restaurante Padre Pedro, o famoso “bandejão”. Ao preço de 1 real, as refeições atraem uma clientela fiel diária, sobretudo de idosos. A fila, que dá a volta no restaurante, já é habitual aos que transitam e trabalham nos arredores. Durante o horário de funcionamento, das 11h às 13h, o movimento no Padre Pedro permanece intenso. E depois do almoço, na volta para casa ou para o trabalho, o cidadão aracajuano enfrenta mais filas. Nos congestionamentos nas principais avenidas da cidade ou nos terminais de ônibus, as pessoas ainda gastam alguns minutos até chegar ao seu destino. Espalhados em diversos locais de Aracaju, os pontos de recarga do Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros do Município de Aracaju (Setransp) reúnem principalmente estudantes, especialmente nos últimos meses, durante o período de recadastramento dos passes escolares.
Filas invisíveis
Longe da cena urbana, uma fila passa despercebida aos olhos da população. Apesar de não ser presencial, a fila de quem espera para receber um órgão é de longe a mais árdua. A enfermeira responsável pela Central de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos de Sergipe (CNCDO/SE) Willyane Almeida relata: “existem casos de pessoas que esperam anos pela doação e acabam morrendo na fila”. A central funciona em anexo ao Hospital de Urgência de Sergipe (Huse), e realiza transplantes de rim, coração (atualmente sem pacientes cadastrados na lista de espera), ossos e córneas. Em 2011 já foram realizados 88 transplantes de córnea para atender a uma fila de 108 pessoas. Já na fila para o transplante de rins, a situação é grave: entre as 281 pessoas cadastradas, só 4 conseguiram transplante, mas houve rejeição em um dos casos.
Apesar da atuação da Organização de Procura de Órgãos e Tecidos (OPO/SE), o processo para a doação é complicado: após a constatação da morte encefálica do doador, é aberto um protocolo e feita uma triagem para constatar a compatibilidade entre doador e receptor. Ainda assim, há a probabilidade de o transplante não ser bem sucedido, e o receptor em potencial acaba voltando à fila. Este quadro está ligado ao pequeno número de doadores declarados, o que se deve ao medo e ao preconceito ainda bastante presentes entre a população. A enfermeira enfatiza: “existe uma grande necessidade de conscientização entre as pessoas. Avisar à família e às pessoas próximas é fundamental”.
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