terça-feira, 20 de setembro de 2011

A arte do 'Velho Chico'



Por Roberto Aguiar, Luiza Cazumbá, Eduardo Ferreira, Mateus Alves e Shayne Coelho  

Localizada à margem direita do Rio São Francisco, a 125 km da capital Aracaju, Santana do São Francisco, com 7.038 habitantes (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística -IBGE/Censo 2010), é o polo sergipano do artesanato de cerâmica. De acordo com o Secretário Municipal de Turismo, Hugo Barroso, 80% da economia do município vêm do artesanato e das olarias de telhas e tijolos. Imagens, peças figurativas, utensílios domésticos e vasos decorativos oriundos do barro são vistos por todas as partes da cidade. Nas portas das casas, nas calçadas, nos comércios e em locais coletivos de comercialização.


A matéria-prima recolhida das lagoas é misturada à areia do ‘Velho Chico’. O processo é realizado manualmente. Os trabalhadores que desenvolvem essa função são chamados de candangos. Cabe às eles prepararem a massa que nas mãos de muitos homens e mulheres santanenses ganha vida vários objetos artesanais.

Dona Mariza Silva tem 47 anos, há 30 anos trabalha com artesanato. “Comecei pintando e depois passei a fazer as peças”, falou enquanto em suas mãos preparava um pequeno pato. Dona Mariza vende seus produtos, junto com outros 66 vendedores, no Centro de Comercialização de Artesanato, localizado na entrada da cidade. De acordo com Dona Mariza, o espaço foi construído pelo governo estadual em 1999 e hoje está sob  responsabilidade da Prefeitura Municipal. A artesã Fátima Carvalho, 43 anos, frisou que cada vendedor contribui com uma taxa de R$10 mensais para pagar a energia, água e garantir a limpeza do espaço. “O Centro de Artesanato serve para que as pessoas possam conhecer melhor, ver de perto, com mais precisão nosso trabalho”, disse Dona Marisa.

Dona Mariza é artesã desde a adolescência. Quando tinha 17 anos começou a trabalhar com a cerâmica.

Produção e Comercialização
Toda a produção, desde a retirada da argila à pintura é feita manualmente. Isso implica em uma divisão social do trabalho que encarece um pouco mais a produção, porém, o uso de tecnologias desestruturaria um processo antigo e desestabilizaria um conjunto enorme de famílias.


Artesão com as mãos na massa no estabelecimento Cerâmica Rodoviária

Uma parcela de trabalhadores sobrevive retirando a argila das lagoas, misturando-as à areia do rio. Pronta para a fabricação do artesanato, a argila é vendida a R$15 a pisa. Isso equivale a mais ou menos 10 bolos. Outra parcela de trabalhadores carrega essa argila até as casas ou cerâmicas de artesanato. Cada ‘carroçada’ custa em torno de R$10. Há a parcela de trabalhadores que sobrevivem vendendo a lenha para manter aceso o forno. Cada fecho custa R$50. Isso sem contar o custo com tinta, verniz, pincel e outros materiais.





Para manter esse equilíbrio na produção os próprios artesãos buscam alternativas. Na Cerâmica Lamujo, nove artesãos dividem o mesmo espaço de trabalho, utilizam o mesmo forno, mas cada um produz o seu artesanato. “A produção fica mais em conta, cada um produz as suas encomendas”, disse Isaac Soares, 34 anos.

Artesãos em atividade na Cerâmica Lamujo.

Outros buscam na inovação a valorização do seu trabalho. Wilson de Carvalho, 44 anos, mais conhecido como Capilé, constrói peças grandes, algumas chegam a medir quase dois metros de altura. “Procuro criar novas figuras, novas imagens e formas. Com isso tenho me destacado e estou ganhando um dinheiro a mais”, disse Capilé. O artesão está construindo um presépio gigante que estará em exposição nas festas natalinas em Aracaju. A obra de arte saiu por R$6.000,00.


A Prefeitura Municipal tem desenvolvido algumas políticas voltadas para os artesãos. Todos são isentos de impostos. Para participação em feiras e exposições garante o transporte dos artesanatos e o stand para que os produtos possam ser comercializados no evento. De acordo com Secretário Municipal de Turismo, a prefeitura está adquirindo um caminhão-baú para prestar serviços exclusivos aos artesãos.

O grande projeto da prefeitura é o Polo Industrial Ceramista. Segundo o Secretário Municipal de Agricultura, Adeilton Tavares, a cerâmica vai sair das ruas e ganhar um lugar específico. “As pessoas poderão ver de perto desde o inicio da produção até a comercialização”, frisou o Secretário. “Vamos tirar os artesãos do fundo de quintal e colocá-los em um polo organizado e estruturado para a produção artesanal”, acrescentou Hugo Barroso, Secretário Municipal de Turismo.

Hugo Barroso (Secretário Municipal do Turismo ) e Adeilton Tavares (Secretário Municipal da Agricultura).


Em 2008, o governo do estadual cedeu uma área para plantio de eucalipto para o corte da lenha. A primeira extração será realizada ano que vem e o projeto é coordenado pelo Sindicato dos Artesãos de Santana do São Francisco e a Associação das Cerâmicas Vermelha (tijolos/telhas). Porém, apenas 30% da produção serão destinadas à cerâmica de artesanato. “Temos apenas três olarias de tijolos e telhas, as outras olarias contempladas nesse projeto são de outros munícipios, inclusive duas são de Colégio, munícipio de Alagoas. O projeto deveria contemplar pelos menos 40% da extração da lenha aos artesãos”, reclamou o Secretário Municipal de Agricultura.

Valorização do artesanato
O artesanato de cerâmica produzido em Santana do São Francisco é vendido para todo o Brasil. Alagoas, Bahia, Pernambuco e Rio Grande do Norte são os estados que mais importam o artesanato santanense. A arte do ‘Velho Chico’ ganhou simpatia dos cubanos, italianos e franceses. Agora, precisa de fato ganhar a simpatia e a valorização dos sergipanos.




A rica produção artística de Santana do São Francisco precisa ser valorizada para que Dona Mariza não reclame que o material por ela produzido e vendido a R$3,00 não seja revendido por R$15,00 em Aracaju. Com 30 anos de profissão, uma valorosa artesã não pode chegar a simples conclusão que “o pouco que ganhamos é somente para o sustento”.


Em meio a todo o rústico processo de produção, nas cerâmicas cheias de argilas e peças figurativas, observamos que a presença de um pequeno aparelho de som era obrigatória. “É para distração. Ouvir música é bom”, disse José Roberto, 43 anos, da Cerâmica Rodoviária. Na verdade é que arte pede arte. Assim como o artesanato santanense pede valorização. Essa esperança brilha nos olhos do jovem Jadilson Carvalho, 13 anos, que há três meses começou a produzir com suas primeiras peças de cerâmica, uma replica de um velho pescador com sua vara de pescar.

Um comentário:

  1. Galera, parabéns. Belíssimas fotos, excelente contextualização. Essa "@F5" vai pegar, viu?! Sucesso.

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