quinta-feira, 20 de outubro de 2011

12/10: Os Dias Diferentes De Um Mesmo Dia


Pelo relato de Dona Aparecida dos Santos, uma brasileira homônima da Padroeira do Brasil, foi possível comparar duas realidades diferentes de uma data emblemática, que na prática se revela como não pertencente a todas as crianças.

Por Andreza Lisboa, Daniel Damasio, Diogo Barros, Edson Costa, Fabrício Barboza e Jefferson Oliveira.

 


A cada dia 12 de outubro, feriado pelo dia de Nossa Senhora de Aparecida, também se comemora o dia das crianças. Motivadas pela folga, famílias partem para os parques, praças e praias à procura de lazer e diversão para seus filhos. Mas além desse cenário encantador,   muitas crianças passam pelo feriado sem motivos nenhum para comemorar. Com histórias de vida que se repetem, crianças vêem o dia, que em tese seria seu, passar repleto de privações e descaso.

Basta observar a história da senhora Aparecida dos Santos, residente do bairro Santa Maria, popularmente conhecida como Terra Dura, que vive em um conjunto de casas doadas pelo governo. Segundo ela, a casa é extremamente pequena possuindo apenas um quarto, que serve para acomodar sete filhos juntamente com ela e seu marido. Trabalhando como catadora, dona Aparecida aproveita os fins de semana e feriados para pedir esmola na praça Hermes Fontes, já que o complemento de R$ 166 oferecido pelo Bolsa Família, programa assistencial do Governo Federal, torna-se insuficiente para sustentar todos da sua casa.


Dona Aparecida ressalta só atuar como pedinte nos dias em que as crianças não têm escola e que, em hipótese alguma, não expõe seus filhos durante a mendicidade. Infelizmente, nem todas as informações fornecidas por dona Aparecida podem ser consideradas confiáveis, já que as câmeras capturaram o momento em que seus filhos iam à porta dos veículos e se arriscavam em busca de míseras moedas dos motoristas.

Outro casal entrevistado foi Israel Vieira da Conceição e Maria de Fátima dos Santos, que possuem um relato de vida muito próximo com a da primeira entrevistada. Só que, quando questionado sobre o porquê seu Israel, um homem em torno de seus 30 anos, não procura um emprego que lhe pague melhor, que o prive de estar atuando como pedinte, ele responde enfaticamente. " Já tentei, mas não dão emprego para pessoas que moram muito longe do centro da cidade, e mais especificamente para quem mora na Terra Dura", diz. Contudo, foi possível notar um tom de desinteresse na resposta de Israel, o que representa, talvez, o real motivo por trás da sua apatia em busca de uma nova perspectiva de vida.


Dura realidade

É dia 12 de outubro de 2011. Encontramos a personagem que abre essa reportagem, Dona Aparecida, em um canteiro próximo à rótula da Avenida Hermes Fontes, que dá acesso a um dos bairros mais nobre da cidade, o Jardins. Aparecida dos Santos, a matriarca, rodeada de filhos e netos, conta parte de sua história se abrigando na sombra de um sol causticante.

Dentre os filhos e netos de Aparecida, uma das crianças mostrava possuir melhor iniciativa e habilidade para abordar os motoristas. Aliás, muitos dos condutores paravam perto do canteiro já com a intenção de doar doces e brinquedos  às criancas, que sempre se prostravam na frente dos veículos.  Mas mesmo quando a criançada desistia da empreitada, a filha mais 'habilidosa' de Aparecida ia para o meio do asfalto, em pleno meio dia, disputando espaço com os outros carros, e insistia no pedido até para os carros com os vidros da janela fechados. A cena era contemplada pela dona Aparecida, e sua filha mais velha, mãe de alguns netos, que ficavam inertes à sombra de uma árvore do local.

No canto de uma árvore, um saco guardava todos os presentes recebidos pelas crianças naquele dia. A filha de Aparecida, aquela que pedia com mais 'habilidade' e 'destreza', manipulava a boneca que foi presenteada, mas parecia estar mais preocupada em guardar os pães dados pelos motoristas. O mais novo dos filhos pede à menina um dos pães que ela guarda, porém, sem muito cuidado, ele deixa o pão cair no meio da calçada imunda, mas o pega e come sem causar nenhuma comoção a sua família.

Feriado de diversão

É dia 12 de Outubro de 2011. Agora, o cenário é diferente do que foi visto anteriormente. No Parque da Sementeira, no bairro Jardins, várias famílias se reúnem para comemorar o dia das crianças. Os brinquedos são tomados por elas, que em sua maioria estão muito bem limpas e arrumadas. Sob o mesmo sol causticante, muitas aparentam estar cobertas com bastante protetor solar, afinal a maioria delas tem a pele muito clara.

A grande quantidade de automóveis de luxo no lado de fora do parque sugere, que muitas das famílias presentes possuem um alto poder aquisitivo. Inclusive, os números da economia mostraram que espera-se um aumento na venda do setor de brinquedos motivadas unicamente pelo feriado.

Direito às crianças
A data 12 de outubro foi escolhida como dia das crianças, por ser o dia da oficialização da Declaração Universal dos Direitos das Crianças, criada pela UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância).
Dentre os vários princípios contidos na declaração, o de número nove diz: “Não se deverá permitir que a criança trabalhe antes de uma idade mínima adequada; em caso algum será permitido que a criança dedique-se, ou a ela se imponha qualquer ocupação ou emprego que possa prejudicar sua saúde ou sua educação, ou impedir seu desenvolvimento físico, mental ou moral.” Certamente o estado de pedinte em meio ao risco do trânsito, visando o sustento da família, é uma transgressão a esse direito.

Aparecida, curiosamente, tem o mesmo nome da santa católica que motiva o feriado. Mas não demonstrou estar num dia festivo. Ao contrário da santa homônima, passava despercebida no meio da Avenida com suas muitas crianças e sendo ela não a motivadora, mas sim o alvo da caridade alheia. 

 
       

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